sábado, 29 de novembro de 2014

Lua especial dia dos namorados.


O anoitecer já pairava sobre nós, a brisa gélida dava um charme a mais para a noite, que alias, já estava deslumbrante por si só.
As estrelas fugiam da reluzente lua, que brilhava mais que um farol no meio do breu oceânico.
Haviam esmiuçados cacos de estrelas por todo o ar.
Ah, mas a lua! Esta estava de encantar, não duvido que os lobos estivessem a cantar em algum lugar.
E minha companhia, pobre de mim, estava em outro lugar, quem sabe junto com os lobos a uivar. Quem sabe... Só sei que não estava lá. Pois lá só havia uma garota chorosa sentada com a lua.

Não sei o que elas esperavam chegar, mas eu não me cansava de fitar, a lua ouvindo o lobo a chamar, e a garota que não parava de chorar.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Não se pode salvar quem não quer ser salvo





Eu ate tentei salvar você
Juro que tentei.
Tentei mostrar o caminho
Te dizer o que fazer.
Mas não sou um tipo de exemplo
Nunca quis ser.
Mas precisava
Por você.
Por você eu precisava, eu queria ser
Mas não fui, não sou.

Sinto muito, mas não posso
Muito menos quem não quer ser salvo.
Então afogue-se
E aprenda a nadar sozinho.

Indo
de si,
des
 cendo
mais, des
sendo,
 indo,
inde
scen
 dendo
de si,
indo
ao s
eu fim,
dando
adeus
ao s
eu eu,
sem sen
tir ma
 is a si
mesmo
e a
inda
 as
sim,
ou por
is
so mes
mo, diz
end
o sim
e si
m ao s
eu mim


_Arnaldo Antunes 

Confidência


Prefiro a paciente
proeza das traças,
meu rapaz,
aos versinhos
bem traçados
dos quais
te mostras capaz
(assépticos e sérios
como os de ninguém mais).
Ah! Ler-te é
penetrar na paz
dos cemitérios.
Ainda respiras, mas já se entrelê,
junto aos títulos
dos teus livros,
os dois precisos vocábulos
 (“Aqui jaz”)
com que, um dia,
te saudarão os vivos.


[Ricardo Aleixo]

Linhas



Incontáveis linhas
como que dispersas
impensáveis línguas
como que dos pernas
cruzam-se no infinito:
ou tornam-se
linguagem
ou deixam o dito
por não dito


[Ricardo Aleixo]

domingo, 2 de novembro de 2014

“O Poeta
quando escreve,
embala a caneta num eterno balé,
que desliza com graça
e desgraça
as coreografias do coração.”

— Sérgio Vaz.
Nuvem
é você
Que não
Posso tocar

Nuvem
É você
Que me faz sombra
E às vezes chora
Sem querer

Tão lá no alto
Mesmo se salto
Não alcanço

Nuvem
É você
Por mais
Que eu almeje
Te tocar

Só faço um sonho
Que evapora ao despertar

Nuvem_Rubel

Histórias das demolições


A história das demolições
a história trágica das demolições
não acontece como no cinema
a vida não tem trilha sonora
as paredes caem silenciosamente 
(no máximo a pancada dos martelos)
a chão varrido fica melhor
(o passado não voltará no ladrilho novo)
lembrar o que quer que seja é inútil
as imagens da memória são ruins
o que ficasse em nós seria a esperança
mas o que existe não exige lembrança
o que morreu está definitivamente morto
não há sequer a vontade de chorá-lo
o luto mesmo é impossível. 

_Fabrício Corsaletti.

Desajeito


O homem inacabado
não tem posição
que lhe traga conforto 
na cama.
Luta a noite toda
com o colchão
sem que seu corpo torto posso encontrar
abrigo.
o pensamento 
do homem inacabado
gira em falso
como as rodas de um carro
encravando na lama.

_Donizete Galvão.

Solistas


Nascem os poemas nas horas turvas 
Ferocidade raiada em ondas
Os dentes escarlates da tarde
A solidão.
Ferem dissonantes o tráfego
in
Visibilidade ao redor 
Fogo salgado nas águas rápidas
Da cidade.
Morrem os poetas nas esquinas
Flautistas breves da impossibilidade.

_Fernando Paixão.

Balanço


A infância não foi uma manha de sol:
Demorou vários séculos; e era pífia,
Em geral, a companhia. Foi melhor, em parte, a adolescência, pela delícia
Do pressentimento da felicidade
Na malícia, na molícia, na poesia,
No orgasmo; e pelos livros e amizades.
Um dia, apaixonado, encarei a minha morte:
E eis que ela não sustentou o olhar 
E se esvaiu. Desde então é a morte alheia
Que me abate. Tarde aprendi a gozar
A juventude, e já me ronda a suspeita
De que jamais serei plenamente adulto:
Antes de sê-lo, serei velho. Que ao menos 
Os deuses façam felizes e maduros
Marcelo e um ou dois dos meus futuros versos.

_Antonio Cicero.
“nem sempre somos
o que queremos ser.
um dia,
pássaros.
um dia,
papel amassado
no chão.
[somos as dobraduras da vida]”

— Descortinar

“Sempre há sobre o que escrever. Cabe a nós percebermos o invisível diante do que se vê!”

— Anne

As três palavras mais estranhas


Quando pronuncio a palavra Futuro,
a primeira sílaba já pertence ao passado.
Quando pronuncio a palavra Silêncio,
destruo-o.
Quando pronuncio a palavra Nada,
crio algo que não cabe em nenhum não-ser.

[Wislawa Symborska]
"E pra que serve mesmo a palavra?
não dá pra explicar a solidão
se você não arranca ela
se você não faz questão
se mesmo depois de tudo
só nos resta um pouco de nada
uma curva distraída no meio da estrada"

[Autor Desconhecido]

“Estávamos ali com o céu em nós. As mãos, unindo os nervos, faziam das duas criaturas uma só, mas uma só criatura seráfica. Os olhos continuaram a dizer coisas infinitas, as palavras de boca é que nem tentavam sair, tornavam ao coração caladas como vinham…”

— Machado de Assis

Palavras Aladas


Os juramentos que nos juramos
Entrelaçados naquela cama
Seriam traídos, se lembrados
Hoje. Eram palavras aladas
E faladas não para ficar
Mas, encantadas, voar. Faziam
Parte das carícias que por lá
Sopramos: brisas afrodisíacas
Ao pé do ouvido, jamais contratos.
Esqueçamo-las, pois, dentre os atos
Da língua, houve outros mais convincentes
E ardentes sobre os lençóis. Que esses,
Em futuras noites, em vislumbres
De lembranças sempre nos deslumbrem.

[Antonio Cícero]

O país das maravilhas



Não se entra no país das maravilhas,
Pois ele fica do lado de fora,
Não do lado de dentro. Se há saídas
Que dão nele, estão certamente à orla
Iridescente do me pensamento,
Jamais no centro vago do meu eu.
E se me entrego às imagens do espelho
Ou da água, tendo no fundo o céu,
Não pensem que me apaixonei por mim.
Não: bom é ver-se no espaço diáfano
Do mundo, coisa entre coisas que há
No lume do espelho, fora de si:
Peixe entre peixes, pássaro entre pássaros,
Um dia passo inteiro lá.


[Antonio Cícero]